ChatGPT, Indústria 4.0 e o futuro do mercado de trabalho

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Por Cíntia Araújo

Se você é usuário de alguma rede social, já se deparou com alguma discussão sobre o tal do ChatGPT. A recente atualização da ferramenta tem causado alvoroço nas redes, onde debates acalorados sobre o tema têm engajado muitos usuários.

O ChatGPT aproxima ainda mais a Inteligência Artificial (IA) do dia-a-dia das empresas, trazendo a possibilidade de automatização de processos repetitivos como revisão de textos e contratos, resumo de textos, criação de apresentações e elaboração de relatórios[1].

Enquanto para entusiastas o ChatGPT traz oportunidades estratégicas para automatização de processos organizacionais repetitivos, liberando tempo dos humanos para que estes se dediquem a tarefas que exijam pensamento crítico, criatividade e capacidade de análise estratégica de diferentes cenários, críticos são mais pessimistas e apontam os riscos da utilização da IA para a destruição de postos de trabalho e aumento do desemprego1.

Inclusive, jornalistas já perguntaram ao próprio ChatGPT quais profissões ele destruirá no futuro😉. Segundo o ChatGPT, as áreas profissionais que a serem mais impactadas são a de marketing (atendimento ao cliente e publicidade), serviços jurídicos, contabilidade e finanças[2].

Confesso que até eu mesma fico apreensiva com este cenário, uma vez que ferramentas como o ChatGPT pode revisar e até mesmo escrever artigos científicos. Se muitos docentes e pesquisadores brasileiros já sentem os duros efeitos da precarização do trabalho, imagina como será o futuro destes profissionais sob o risco de serem substituídos pela IA?!

Avanços da tecnologia sempre trazem discussões e preocupações em relação à substituição do trabalho humano pela “máquina”. Há muito falamos da Indústria 4.0 e as competências que os profissionais precisam desenvolver para enfrentar a nova realidade do mercado de trabalho.

A 4ª Revolução Industrial, que iniciou na primeira década do século XXI, caracterizada pela digitalização da produção e personalização da produção em massa, tem desencadeado no surgimento de novos modelos de negócios[3].

A nova realidade da Indústria 4.0 suscita grandes avanços para a indústria e inovação. Todavia, o país está engatinhando quanto à digitalização do mercado de trabalho e inserção das novas tecnologias nos processos de produção se comparado a países mais desenvolvidos.

Em entrevista a UOL o economista José Pastore[4] comenta que a digitalização dos processos executados pelo “chão” do setor de serviços ainda é muito lenta. Para se ter uma ideia, 2/3 das vagas de trabalho são de baixa qualificação.

Ainda não é possível “bater o martelo” sobre o real impacto do ChatGPT no mercado de trabalho brasileiro: não é possível mensurar quantos postos de trabalhos serão destruídos pela ferramenta e nem quantos serão criados no futuro.

Todavia, de uma coisa já sabemos: o mercado de trabalho brasileiro tem sentido os impactos da Indústria 4.0, e, infelizmente, os impactos têm sido muito negativos. Recentemente, a Volkswagen e a GM deram férias coletivas a 5 mil funcionários das fábricas localizadas no Vale do Paraíba. Executivos das empresas explicaram que tal medida foi tomada devido à desaceleração do mercado de veículos novos, queda de vendas e alta dos juros[5].

Este evento não foi um caso isolado. Ainda são recentes as saídas da Mercedes-Benz (2020) e da Ford (2021) do Brasil, a última, encerrando sua produção após quase um século de atividades no país[6].

Este movimento da indústria automobilística, resultado de uma série de fatores como oscilação do mercado e a necessidade atualização das linhas de produção para recebimento da eletrificação, indica a necessidade urgente de melhoria na educação e atualização da força de trabalho, que se encontra despreparada para este cenário.

Assim, deparamo-nos com uma conjuntura preocupante: em meio a altos índices de desemprego, informalidade e subocupação, o setor industrial carece de profissionais com as competências necessárias para adaptação das empresas à realidade da Indústria 4.0. Por isso, o debate sobre o impacto da alta tecnologia no mercado de trabalho, vai muito além da aplicabilidade do ChatGPT. É fundamental que a sociedade, Estado e empresas de todos os setores se unam para desenvolvimento de programas estruturantes para melhoria da educação básica e da atualização da força de trabalho. Isto sim precisa ser o foco dos nossos esforços e discussões. Se não agirmos agora, além de perdermos uma janela de oportunidade única do bônus demográfico que comentei em artigo recente no Denarius[7]– vamos nos aprofundar na, já abismal, desigualdade social que tanto mal tem causado a todos nós.


[1] Sutto. G. (2023, March 24). ChatGPT é vilão ou oportunidade no mundo do trabalho?. InfoMoney. https://www.infomoney.com.br/carreira/chatgpt-e-vilao-ou-oportunidade-no-mundo-do-trabalho/   

[2] Juliboni, M. (2023, March 7). ChatGPT lista profissões que serão extintas por ele, e dá dicas para você manter seu emprego. Confira!. MoneyTimes. https://www.moneytimes.com.br/chatgpt-lista-profissoes-que-serao-extintas-por-ele-e-da-dicas-para-voce-manter-seu-emprego-confira/

[3] Aires, R. W. do A., Moreira, F. K., & Lima, P. de S. (2017). Industria 4.0: Competências Requeridas aos profissionais da Quarta revolução Industrial. VII Congresso Internacional de Conhecimento e Inovação.

[4] Papp. A. C. (2023, March 23). ChatGPT: ‘Destruiçao de empregos é rápida e visível; já a criação é lenta e invisível’ diz Pastore. Tilt UOL. https://www.uol.com.br/tilt/ultimas-noticias/estado/2023/03/26/chatgpt-destruicao-de-empregos-e-rapida-e-visivel-ja-criacao-e-lenta-e-invisivel-diz-pastore.htm  

[5] Santos, C. (2023, March 27). Volkswagem e GM inicial férias coletivas para 5 mil trabalhadores nas fábricas do Vale do Paraíba. G1. https://g1.globo.com/sp/vale-do-paraiba-regiao/noticia/2023/03/27/volkswagen-e-gm-iniciam-ferias-coletivas-para-5-mil-trabalhadores-nas-fabricas-do-vale-do-paraiba.ghtml

[6] Perono, J. (2022, September 15). Como estão as fábricas após fechamento de Ford e Mercedes-Benz no Brasil. Jornal do Carro. https://jornaldocarro.estadao.com.br/carros/como-estao-as-fabricas-de-carros-apos-fechamento-de-mercedes-e-ford-no-brasil/

[7] Araújo, C. C. S. (2023, March 7). Quanto empreender não é sonho, é necessidade: o dilema dos jovens no século 21. BOLETIM DENARIUS. https://denarius.info/quando-empreender-nao-e-sonho-e-necessidade-o-dilema-dos-jovens-no-seculo-21/