Recuperação Judicial: assembleia-geral de credores e o voto abusivo

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Por: Alcides Wilhelm

Um dos momentos mais importantes de um processo de recuperação judicial é a assembleia-geral de credores, que deliberará sobre o plano de recuperação apresentado pela recuperanda. Trata-se de momento crucial, onde a continuidade da empresa está nas mãos dos credores quando se manifestarem sobre a viabilidade do plano.

Com as alterações introduzidas pela Lei n. 14.112/20, caso o plano seja rejeitado, o administrador judicial submeterá à votação da assembleia-geral de credores a concessão do prazo de 30 dias para que os credores apresentem um plano alternativo, conforme determinação do § 4º do art. 56 da referida norma.

Caso o plano tenha sido reprovado em uma das classes, porém houve votos favoráveis de credores que representem mais da metade de todos os créditos presentes à assembleia, independente de classes, e na classe onde fora rejeitado tenha voto favorável de mais de 1/3 dos credores, o juiz poderá conceder a recuperação judicial (cram down), conforme disposto no § 1º do artigo 58 da Lei n. 11.101/05.

Nota-se que a opção do legislador pela falência acontece apenas em último caso, apresentando alternativas a manutenção da atividade mesmo com o plano sendo reprovado. Ou seja, o princípio da preservação da empresa está mais do que presente nos respectivos artigos.

Porém, mesmo com a lei optando pela preservação da empresa, quando recuperável, pois em situação oposta o instituto à disposição é a falência, muitos credores jogam de forma egoísta, pensado apenas na recuperação do seu crédito, em detrimento de toda uma coletividade de credores, bem como da sociedade que depende daquela atividade econômica para sua subsistência, votando contrário mesmo quando o plano de recuperação apresentado seja viável.

Por óbvio, tais posicionamentos contrários são identificáveis, pois o referido credor vota contra sem ter justificativa plausível, a não ser a recuperação do seu crédito ou querendo causar prejuízos a terceiros. Em regra, toma posicionamentos onde não aceita negociar prazos de carência, pagamentos a longo prazo, e muito menos deságios e juros civilizados, mesmo tendo ciência da viabilidade do plano apresentado pela recuperanda. Tal disposição encontra guarida no § 6º do art. 39 da Lei n. 11.1010/05, bem como amplamente difundida pela jurisprudência de nossos tribunais, que afasta o direito de voto nessas circunstâncias.

Segundo Sacramone, “a recuperação judicial deve ser definida, assim, justamente com base nessa finalidade de propiciar o comportamento colaborativo de todos os credores em prol da superação da crise empresarial”. Destarte, a recuperação judicial visa alcançar interesses mais abrangentes, não se atendo apenas aos individuais de cada credor.

 Em síntese, quando tratamos de empresas em recuperação judicial precisamos ter em mente que será inevitável a ocorrência de perdas para as partes envolvidas, seja para a devedora, seja para os credores, que muitas vezes precisam renunciar à parcela de seus créditos, mas isso não justifica um voto contrário quando o soerguimento da companhia é possível e benéfico em prol de toda a sociedade.


ALCIDES WILHELM – Advogado e Contador. Formado em Direito e em Ciências Contábeis pela Fundação Universidade Regional de Blumenau (FURB). Especialista em Gerência Contábil e Auditoria pela Fundação Universidade Regional de Blumenau (FURB). Especialista em Finanças Empresariais pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) e em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários (IBET). Mestre em Direito Empresarial e Cidadania pela Faculdade de Direito de Curitiba (UNICURITIBA).

SACRAMONE, Marcelo Barbosa. Comentários à Lei de Recuperação de Empresas e Falência, São Paulo: Saraiva, 2021, p. 239.

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