No olho do furacão

Foto: macrovector/Freepik

Cenário geopolítico que vem se formando para 2023 não deve ser de águas calmas para governos e empresas ao redor do mundo

Por Estela Cangerana

Eleições conturbadas, problemas econômicos, sociedade dividida, crescimento de posições radicais. Essa descrição, que poderia ser aplicada ao Brasil, na verdade, se refere a uma realidade que vem sendo vista em diferentes países, se soma a tensões externas e pode esquentar o cenário mundial nos próximos anos. A começar pelo campo político, que viu a temperatura subir nas últimas semanas.

Nos Estados Unidos, neste mês de novembro, as eleições de meio de mandato (as midterms, que ocorrem após dois anos do pleito presidencial e definem a nova Câmara dos Deputados, um terço do Senado e governadores de vários estados) refletiram nas urnas um país altamente polarizado e a frágil situação do presidente democrata Joe Biden. Temas como aborto, inflação e criminalidade protagonizaram discussões acirradas e mostraram o abismo cada vez maior entre esquerda e direita. 

Com altos índices de desaprovação popular e o Congresso controlado pelos republicanos, a agenda de Biden se inviabiliza. O ex-presidente Donald Trump, por sua vez, tem aproveitado para tentar fortalecer uma possível candidatura sua para 2024. 

Em Israel, o ex-primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, que responde a processo por corrupção, venceu as eleições legislativas. Ele volta ao poder junto com aliados de partidos ultraortodoxos e da extrema direita, forças que ele precisa acomodar na composição do novo governo. 

A extrema-direita também subiu ao poder na Itália, com a ascensão de Giorgia Meloni ao cargo de primeira-ministra. Enquanto isso, no Reino Unido, a população começa a se acostumar com o seu novo primeiro-ministro Rishi Sunak, que assumiu a liderança pelo Partido Conservador após a passagem relâmpago de Liz Truss, que por sua vez substituiu o polêmico Boris Johnson.

Já na China, o Congresso do Partido Comunista confirmou Xi Jinping no poder e ele inicia seu terceiro mandato como presidente, se consolidando como o líder chinês mais poderoso desde Mao Tsé-tung. O evento registrou uma cena simbólica histórica, com a retirada do ex-presidente Hu Jintao do palco.

Escalada de tensões externas

Ao mesmo tempo em que vários países desenham suas configurações políticas para os próximos anos, as tensões externas aumentam, tanto em ameaças de conflito quanto em ações reais. A Coreia do Norte vem respondendo a exercícios militares conjuntos dos Estados Unidos e da Coreia do Sul com mísseis, em ações que chamam de “firmes e avassaladoras”. 

Essa pode ser uma estratégia do líder norte-coreano Kim Jong-un para preparar terreno para um teste nuclear, algo que não acontecia desde 2017. Ele, inicialmente, elevaria a tensão entre os países a um nível grave, para depois pedir concessões aos Estados Unidos, Coréia do Sul e Japão. Mas as provocações de Pyongyang, somadas ao acirramento das ameaças da China a Taiwan, podem estar levando a uma reação diferente do Japão. O governo decidiu propor a duplicação do orçamento de defesa e a compra de armas de longo alcance, em um movimento armamentista do país que não se via desde a Segunda Guerra Mundial.

Tudo isso sem falar no prolongamento da guerra na Ucrânia, invadida pela Rússia. O conflito, que persiste muito além de todas as previsões iniciais, continua trazendo diversos impactos humanitários e econômicos.

O campo da economia, aliás, é também um dos fatores críticos para o futuro, sofrendo ainda com efeitos da pandemia de COVID-19. Problemas como inflação, desemprego, crescimento morno ou nulo são recorrentes ao redor do mundo. E, para completar essa mistura, estão os desafios ambientais resultantes do aquecimento global.

Dizem os meteorologistas que a temperatura das águas do mar influencia muito na violência da formação de um furacão. Quanto mais quentes, maior a força de destruição do fenômeno. A medir pelas temperaturas das águas nos campos político e econômico, adicionadas aos ventos das tensões territoriais e ambições de poder no mundo, 2023 pode ser o ano dos furacões. No Brasil, teremos que equilibrar as nossas questões internas com os raios e trovões das tempestades globais. É bom estar preparado.