Inovação responsável: um direcionamento ético e integrativo

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Por Thais Assis de Souza

Quando falamos de inovação, questões básicas emergem sobre o que será criado e quais resultados práticos. Mas, indo além, devemos questionar: quais serão as implicações desta inovação? Que futuro queremos para o presente e para as próximas gerações?

Conhecemos a inovação pelo seu conceito multifacetado em termos do que será  entregue de novo, original ou melhorado. De maneira geral, a inovação engloba atividades de exploração e conversão de ideias em resultados comercializáveis, trabalhando, para isto, a combinação de criatividade intelectual e prática. 

No entanto, ainda que a proposta geral seja a oferta de benefícios, não há garantia de que todos resultados diretos e indiretos sejam essencialmente bons. Como um exemplo tem-se o pesticida DDT que, ainda que com a proposta de combater vetores de doenças como a malária, a partir de um uso indevido pelo baixo custo, outras aplicações passaram a ser adotadas e então surgiram impactos negativos significativos. 

Com o desenvolvimento de diferentes tecnologias ao mesmo tempo e de maneira rápida, é preciso enfatizar cada vez mais a necessidade de considerar o processo de inovação de forma reflexiva. Com este raciocínio Hans Jonas discutiu em 1984 os impactos tecnológicos sob a lente do princípio de responsabilidade. Para o autor, a responsabilidade deve ser vista além das relações entre os seres humanos e entre estes e os ecossistemas naturais. As interrelações entre sistemas devem ser estudadas, analisadas e tratadas considerando os efeitos a longo prazo. 

Em meados de 2010, as discussões de inclusão da responsabilidade na inovação chegaram a níveis de discussões políticas. Dentre as frentes da Comissão Europeia, inserido nas ideias do programa “Horizon 2020″, emergiu o termo Pesquisa e Inovação Responsável (responsible research and innovation – RRI) como um quadro de política científica. Considerando além das racionalidades acadêmicas e políticas, há um corte no conceito mais amplo de RRI com foco nos sistemas de inovação: a Inovação Responsável (IR). 

Conceitualmente, não há uma definição comum para IR. Suas premissas básicas se concentram em ações sistêmicas baseadas na ética, co-criação e co-produção de resultados a partir do alinhamento de valores, necessidades e expectativas das partes interessadas sempre atentas ao compromisso com o presente e consciência sobre o futuro. Assim, há a associação de desempenho, crescimento e responsabilidade para gerar resultados socialmente e ambientalmente desejáveis.

A IR busca antecipar riscos e resistências, compreender incertezas, motivações, propósitos, estruturas sociais, valores coletivos e aspectos de flexibilidade e adaptação a partir de uma abordagem interdisciplinar e transdisciplinar onde há visão integrada das partes interessadas. No entanto, existem críticas relacionadas com a relação estrita com questões políticas globais do Norte e a falta de abordagens práticas para implementação das ideias de IR. O que é ressaltado, de maneira geral, são aspectos de dinâmica de poder, tanto internamente em relação aos atores do sistema de inovação, quanto à posição das economias na corrida de “prioridades globais”.

Dentre as discussões dos principais estudiosos da área como Richard Owen, Phil Macnaghten, Jack Stilgoe e René von Schomberg, os aspectos de governança surgem como centrais ao partirem de uma lente de ajuste de questões do “por que” ao “como” para enfrentar desafios. Ao tratar da sociedade, mercado e meio ambiente como sistemas indissociáveis, defende-se o sistema de inovação com natureza multidisciplinar no que diz respeito às partes interessadas (inclusão). Assim, há o favorecimento do esforço de reduzir incertezas futuras (antecipação) a partir da consideração de limites, barreiras e determinações (reflexividade), o que aprimora a capacidade de responder aos impactos potenciais de maneira amais positiva possível (capacidade de resposta). 

A IR, então, associa os “Ps” da inovação tecnológica (produto, patente, produção, lucro, pioneirismo) aos “Ps” responsáveis: pessoas e planeta. Para tanto é necessário dar atenção aos vínculos, fluxos, mercados, ambientes políticos, infraestrutura, diversidade e cultura trabalhando com consciência ética.

Ao reconhecer que o futuro é construído no presente, as inovações que partem de premissas responsáveis tratam objetivos e planejamentos com vistas a minimizar os efeitos negativos se tornando, assim, potenciais motores de crescimento e melhorias para a sociedade, mercado e meio ambiente.

O que é, então, necessário para incorporar responsabilidade às inovações? É fundamental criar uma cultura de responsabilidade para que seja estabelecido um ecossistema responsável onde todos as partes envolvidas falem a língua da ética, da cooperação, da interação e do benefício a diferentes gerações.