A recuperação judicial como solução para a crise Econômico-Financeira

Foto: lovelyday12/Freepik

Por Alcides Wilhelm

Num mundo onde a volatilidade dos mercados é cada dia mais constante e imprevisível, ter um instrumento que auxilie as empresas a superarem suas dificuldades é imprescindível. Desde 2005, com a edição da Lei 11.101/2005 (Lei de Recuperação de Empresas e Falências), o Brasil passou a figurar entre as principais economias que possuem legislação moderna em matéria de insolvência.

A legislação anterior, Decreto-lei 7.661/1945 (Lei de Falências), vigorou por longos 60 anos sem profundas alterações, tendo sido concebida para solucionar os problemas que afetavam as empresas em um momento econômico pós Segunda Guerra Mundial, não cumprindo mais com a sua finalidade.

 A economia brasileira, nesse período, passou por profundas transformações, alinhando-se com a evolução econômico-social ocorrida nos principais países. É nesse contexto, onde o dinamismo da atividade empresária e as crises vivenciadas pelas economias globais, cujos reflexos são sentidos nos quatro cantos do mundo, que uma nova realidade se forma, exigindo respostas rápidas e adequadas para solucionar as crises pelas quais as empresas podem passar.

 É para este cenário que a Lei de Recuperação de Empresas foi instituída, tendo por objetivo, conforme disposto em seu art. 47, “viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica”.

Diferente da legislação anterior, cujo foco principal era a extinção da atividade empresária, ou seja, a sua liquidação, conforme pode ser observado pela denominação da norma, Lei de Falências, a lei atual trouxe modernidade e dinamismo para a reestruturação dos negócios. A possibilidade de reestruturar a atividade utilizando-se dos mais variados meios, é fator primordial, permitindo que cada caso seja tratado segundo as suas particularidades.

Dentre os meios as serem utilizados para o soerguimento da sociedade empresária, a Lei 11.101/2005, em seu art. 50, trouxe um rol exemplificativo das medidas que podem ser adotadas, dentre elas, destacamos: a) concessão de prazos e condições especiais para pagamento das obrigações vencidas ou vincendas; b) cisão, incorporação, fusão ou transformação de sociedade, constituição de subsidiária integral; c) alteração do controle societário; d) trespasse ou arrendamento de estabelecimento; e) venda parcial dos bens; f) equalização de encargos financeiros relativos a débitos de qualquer natureza; g) administração compartilhada; h) emissão de valores mobiliários; i) constituição de sociedade de propósito específico para adjudicar, em pagamento dos créditos, os ativos do devedor; j) conversão de dívida em capital social; k) venda integral da devedora; l) redução salarial; entre outros.

Os meios atuais de reestruturação à disposição são muito diversificados, possibilitando que a empresa em dificuldades possa lançar mão de inúmeras estratégias para viabilizar sua recuperação. Não há mais limites, dependendo apenas da capacidade técnica dos diretamente envolvidos na elaboração do plano de recuperação judicial. É um momento de recriação do negócio, sendo admitida a utilização de todos os meios não defeso em lei. Dos planos apresentados pelas recuperandas, segundo pesquisa realizada em 2018 pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo em conjunto com a Associação Brasileira de Jurimetria, é possível verificar alguns pontos em comum, dentre eles: i) prazo de carência para início dos pagamentos aos credores; ii) aplicação de deságios; iii) alongamento do perfil da dívida; e, iv) taxas de juros civilizadas.

Em síntese, a pesquisa apresentou os seguintes índices em relação aos credores com garantia real: prazo médio para pagamento de 9 anos; deságio médio de 37,2%; taxa de juros de 3,4% ao ano. Para os credores quirografários: prazo médio também de 9 anos; deságio médio de 59,3%; taxa de juros de 2,9% ao ano. Quanto aos credores trabalhistas: prazo para pagamento de 1 ano (prazo legal); deságio médio de 3,1%; taxa de juros de 0,6% ao ano.

Da análise dos dados acima, conclui-se que a recuperação judicial pode ser um excelente caminho a ser utilizado pelas companhias em crise, pois traz condições de negociação diferenciadas, as quais dificilmente seriam obtidas por meio de uma solução de mercado. Somando-se isso com as demais medidas adotadas de reestruturação do negócio que foram apresentadas no plano de recuperação judicial, a probabilidade de êxito de um projeto de recuperação judicial é extremamente alto.

O que se observa, em regra, quando do insucesso de uma recuperação judicial, é a utilização do instituto de forma inadequada, pensando-se apenas nas questões financeiras (carência, deságio, prazo, juros), não realizando o dever de casa, que é a reestruturação das atividades operacionais da empresa. Além desse ponto, ainda há uma outra questão que agrava os projetos, trata-se do timing, ou seja, do momento ideal para ingressar com o pedido de recuperação judicial.

Invariavelmente os responsáveis pela gestão do negócio somente buscam o benefício legal quando a situação está insustentável, não havendo mais, recursos em caixa, nível de estoques adequados à operação, títulos a receber disponíveis para negociação, crédito junto aos fornecedores e as instituições financeiras etc., enfim, deixando em xeque o princípio da continuidade da entidade.

Porém, a Lei de Recuperação de Empresas brasileira, juntamente com as alterações trazidas pela Lei 14.112/2020, que modernizaram ainda mais o instituto recuperacional, possibilita, sem sombra de dúvidas, o soerguimento das empresas em crise, pois traz em seu texto regras modernas e alinhadas com as normas de insolvência das principais economias mundiais, bem como com a lei modelo sugerida pela United Nations Commission On International Trade Law (UNCITRAL). Em suma, temos à disposição uma norma de insolvência de primeiro mundo.

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