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Por Sonia Rosa Arbues Decoster, Consultora em TI, Sócia na Atiki Consultoria e professora do Programa de Mestrado Profissional da Fipecafi
A América Latina vem demonstrando ser, nos últimos anos, uma região de alta atratividade para investimentos de Venture Capital, em virtude do cenário maduro de inovação no segmento das startups. Neste contexto, o Brasil é o que apresenta maior número de “startups unicórnio”, que são aquelas que alcançaram o valor de mercado acima de 1 bilhão de dólares. Dentro deste segmento, segundo o Fintechs Report 2022, da plataforma Distrito, pode-se salientar o papel das fintechs, pelo fato de que dos US$ 9,4 bilhões investidos em startups brasileiras em 2021, 40% foram alocados em fintechs, com a categoria de crédito como a mais representativa, seguida pelas categorias de meios de pagamento e serviços digitais.
Vale lembrar que as fintechs voltadas às soluções financeiras são agentes preponderantes na mudança do cenário bancário e com foco nos “desbancarizados”, além do fomento de um ambiente inovador e de dinamismo. Ainda que o investimento em startups como um todo tenha sofrido uma desaceleração em 2022, afinal, depois de um ano como o de 2021, que foi sem precedentes em termos de investimentos injetados no ecossistema brasileiro, o segmento das fintechs da América Latina captou em abril US$ 318 milhões em 73 rodadas, conforme a plataforma Latam Sling Hub. Seis das dez maiores rodadas de investimentos foram alocadas em fintechs. Pode-se citar dentre estas seis, a Celcoin que recebeu R$ 85 milhões da Innova Capital e a Stark Bank que obteve US$ 45 milhões em um primeiro aporte feito em um negócio no Brasil pelo fundo de Jeff Bezos, fundador da Amazon. Outro dado estimulante é que, de janeiro a abril deste ano, as fintechs captaram US$ 1,9 bilhão, valor superior ao mesmo intervalo de meses em 2021.
O mês de março de 2022 já havia também evidenciado rodadas de investimentos expressivas dentre as fintechs, com montantes na série C, na Flash de US$ 100 milhões liderada pelos fundos Battery Ventures e WhaleRock; na Gringo, série B de US$ de 36,8 milhões, liderada pelo fundo de venture capital VEF e com coinvestimento da Píton Capital e na Contabilizei, série C de US$ 60 milhões liderada pelo SoftBank.
Numa rodada seed, estágio embrionário, aquela em que se dá o desenvolvimento da ideia, projeto ou produto, com um risco de se investir significativo, a fintech brasileira Kamino obteve o maior investimento da região até o momento: US$ 6,1 milhões em um financiamento puxado pela Inspired Capital Partners (Sling Hub, 2022).
tech é analisada a partir de diferentes critérios pelos investidores, tais como: o modelo de negócio, a concorrência, o tamanho de mercado e o potencial de crescimento. Na série B, a empresa está consolidada e o investimento tem o objetivo de expandir o negócio, recrutar talentos, aperfeiçoar processos, por exemplo. A série C é representada pelo objetivo de acelerar a empresa, que pode ser uma expansão internacional, categoria em que os fundos de Venture Capital visualizam potencial de escalabilidade e normalmente antecede a abertura de capital (IPO).
Repetindo o desempenho demonstrado em março, as fusões e aquisições (M&A) na América Latina foram as mais verificadas no segmento das fintechs. Só em abril, 22 operações de M&A de um total de 26 ocorreram no Brasil. Isto se dá pelo fato de que, tanto o potencial de crescimento quanto o amadurecimento que tem sido registrado pelas startups são visualizados pelas empresas tradicionais. Daí, as práticas de fusão e aquisição vêm ocorrendo pelo fato de que esta é uma forma das empresas de impacto no mercado fazerem parte do ecossistema de inovação, mantendo-se atualizadas em relação às novas tecnologias e às reais necessidade do cliente.
Outro ponto preponderante neste contexto é o relativo à regulação, pois tanto o Banco Central (Bacen) quanto o Conselho Monetário Nacional (CMN) têm procurado publicar normas e regulamentos que visam o acompanhamento da evolução do sistema financeiro e dar a segurança jurídica aos clientes das fintechs. Após a Resolução no. 4656/2018, a qual instituiu os modelos de Sociedade de Crédito Direto (SCD) e da Sociedade de Empréstimo entre Pessoas (SEP) para as fintechs de crédito, a Resolução no. 4657/2018 permitiu que as fintechs pudessem exercer atividades relacionadas à securitização, como também realizar operações de custódia sem a intermediação de um banco tradicional. A Resolução no. 4658/2018, revogada pela Resolução no. 4893/2021, estabeleceu a criação de sandbox regulatório, o qual seria um ambiente controlado de testes para inovações financeiras. E por último, em 2022, o BC instituiu as regras prudenciais para as instituições de pagamento (IPs), colocando-as no mesmo nível das instituições financeiras. Sendo que esta última entrará em vigor em janeiro de 2023 e a total implantação acontecerá em janeiro de 2025.
Com este panorama de reconhecimento de um ecossistema maduro e completo, constituído de hubs de inovação, aceleradoras maduras e uma cadeia de capital estruturada, com investidores nos diferentes estágios de crescimento, podemos vislumbrar algumas tendências em um futuro de curto e outro de longo prazo. A evolução do open banking para o open finance e das transações descentralizadas (Defi), estas construídas em rede de blockchain, impulsionarão mais rodadas de investimento para a criação de fintechs neste setor. Convém salientar que um passo à frente foi dado no mercado das criptomoedas com a aprovação pelo Senado do projeto de lei 4401/21 quanto à sua regulamentação. Outro caminho que se pode descortinar é o das empresas criando suas próprias fintechs com o intuito de agregar serviços financeiros às suas atividades- -fim. Por fim, em um futuro a longo prazo, com a introdução do Real Digital que continuará no processo evolutivo de inclusão financeira pós- -advento do Pix, o Brasil assume um papel perene de protagonismo no ecossistema de inovação do segmento financeiro na América Latina.
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