A decisão de adoção do hedge accounting: volatilidade e IFRS 9

Ralny Pereira Maia e Profa. Dra. Luciana Maia Campos Machado

*Artigo baseado na Dissertação apresentada ao Programa de Mestrado da Faculdade Fipecafi – Fundação Instituto de Pesquisa Contábeis, Atuariais e Financeiras.

O Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC) foi criado em 07 de outubro de 2005 por meio da resolução CFC Nº 1.055/05, sendo responsável pelo estudo e preparação de documentos técnicos contábeis com intuito de prover a uniformização dos procedimentos contábeis trazendo a convergência da contabilidade brasileira aos padrões internacionais.

As normas internacionais de contabilidade chamadas de International Financial Reporting Standards (IFRS) foram introduzidas no Brasil em 2008 por meio do Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC) e pelas leis de números 11.638/2007 e 11.941/2009 com objetivo de prover a harmonização da contabilidade brasileira aos mercados internacionais, projetando as empresas situadas no Brasil nesse mercado.

A partir da introdução das IFRSs no Brasil, a contabilidade passou a se representar pelo conceito da essência sobre a forma, sendo pautada mais em princípios do que em regras, baseando-se em julgamentos profissionais.

Seguindo essa diretriz e alinhado com o IASB, o CPC emitiu uma série de normas contendo diretrizes contábeis sobre instrumentos financeiros, sendo elas o “CPC 38 – Instrumentos Financeiros: Reconhecimento e Mensuração”, “CPC 39 – Instrumentos Financeiros: Apresentação”, “CPC 40 – Instrumentos Financeiros: Evidenciação” e por último o “CPC 48 – Instrumentos Financeiros” que foi emitida em 2018 revogando as instruções das normas emitidas anteriormente.

Os pronunciamentos contábeis (CPCs) de instrumento financeiro trazem para as empresas o conceito de contabilidade de hedge, mais precisamente o hedge accounting, como uma opção não obrigatória com intuito de refletir a operação dentro de sua essência econômica no que se refere aos reconhecimentos de ganhos e perdas de derivativos e ou exposição cambial nessas operações.

O hedge accounting pode ser conceituado como uma tratativa contábil com intuito de proteção e reconhecimento nos resultados de ganhos e perdas dos instrumentos protegidos somente quando são reconhecidos os ganhos e perdas dos objetos protegidos. Esse conceito tem como objetivo se embasar na política de riscos das companhias, eliminando as variações no resultado dos instrumentos protegidos.

O principal objetivo do hedge accounting é demonstrar os efeitos da gestão de riscos e exposição que podem afetar o resultado das entidades que utilizam instrumentos financeiros através das demonstrações financeiras.
Considerando os conceitos trazidos pela contabilidade de hedge, fica evidente que a prevalência da essência sobre a forma torna a contabilidade um instrumento utilizado pela ótica de julgamento e adaptável para refletir a realidade de cada modelo de negócio.

A IAS 39 (correlata ao CPC 38 no Brasil) era fortemente criticada por preparadores de demonstrações financeiras em razão da dificuldade de seu entendimento e, ser pautada em regras complexas deixando de lado os princípios e a essência econômica do risco.

Nesse sentido, o IASB aplicou seus esforços na IFRS 9 em trazer um conceito mais atrelado a princípios do que em regra motivado pelas críticas sobre o IAS 39 no que tange a dificuldade de sua interpretação e dificuldades na aplicação de seus requerimentos. A nova norma tem como objetivo alinhar a interpretação contábil com as atividades de gerenciamento de riscos da entidade.

Em 2018, o CPC 38 foi substituído pelo CPC 48 (correlato ao IFRS 9), sendo sua aplicabilidade permitida para a contabilidade de hedge, ficando a critério dos preparadores escolher a política que melhor se aplica a sua organização conforme descrito no item 7.2.21 do CPC 48.

Em nota publicada em 11 de janeiro de 2019 nomeada de ofício-circular/cvm/snc/SEPNº 01/2019 a Comissão de Valores Imobiliários descreve que a partir da IFRS 9 o hedge accounting se orienta para ser uma escolha contábil das empresas e, cita que o capítulo 6 da IFRS 9 mantém as disposições da IAS 39.

O hedge accounting sob a ótica da IFRS 9 é mais flexível trazendo um alinhamento no tocante às políticas de gerenciamento de riscos, baseando-se em princípios e eliminando limitadores da norma antiga, no qual não se faz mais necessário o teste de eficácia retrospectivo exigido na norma anterior (80-125%).

O capítulo de hedge accounting dentro da IFRS 9 não teve alterações substanciais nas seções de reconhecimento e mensuração. As principais alterações estão relacionadas a simplificação do teste de efetividade, limitação de revogação voluntária e o alinhamento do modelo quanto à efetiva gestão de riscos da companhia.

A temática hedge accounting tem sido amplamente explorada na literatura em razão da complexidade de sua aplicabilidade e constantes alterações para refletir sua essência econômica.

Alguns autores identificaram evidências que o hedge accounting introduz subjetividade no processo do reconhecimento contábil e fornece margem gerenciamento de resultados considerando que o os dados em outros resultados abrangentes não são corretamente interpretados pelos analistas e investidores. Além disso, existe evidência empírica que incentivos de gerenciamento de resultados são determinantes para decisão de designar derivativos como hedge accounting.

Trazendo essas considerações, coloca-se hoje a seguinte questão: quais são as determinantes da decisão das empresas brasileiras para adoção da contabilidade de hedge, mais precisamente o hedge accounting, de fluxo de caixa após a IFRS 9?

As empresas têm como principal motivação pela opção da adoção do hedge accounting a diminuição da volatilidade de ganhos e perdas dos instrumentos de hedge em sua demonstração de resultados, reconhecendo seus efeitos no resultado apenas quando o objeto protegido de hedge é reconhecido. O principal benefício de sua adoção é evitar a volatilidade dos instrumentos de hedge nos seus resultados.

Ralny Pereira Maia
Gerente Executivo de Contabilidade, Tributos e Tesouraria do Cartão Elo com ampla experiência profissional nas áreas de contabilidade, tributos, controles internos e finanças com atuação em empresas nacionais, multinacionais e auditoria (Big 4). Graduado em Ciências Contábeis pela Universidade do Estado de Minas Gerais, cursando Mestrado Profissional em Controladoria e Finanças na Faculdade Fipecafi.

Profa. Dra. Luciana Maia Campos Machado
Superintendente Acadêmica da Faculdade Fipecafi e pesquisadora do núcleo de docentes permanentes do Mestrado Profissional em Controladoria e Finanças da Faculdade Fipecafi. Doutora em Administração de Empresas na linha de pesquisa de Finanças pela Fundação Getúlio Vargas (FGV/EAESP) e Mestre em Finanças pelo Centro Universitário FECAP. Já atuou como Coordenadora de Graduação EaD, Coordenadora Geral do Núcleo de Ensino a Distância e Docente de Graduação na Faculdade Fipecafi. Foi pesquisadora do Centro de Estudos em Finanças da FGV e lecionou na pós-graduação e MBA da FECAP. Atuou como Consultora Acadêmica para Administração e Ciências Contábeis no grupo SOMOS Educação e em multinacionais como Avon e Unilever nas áreas de Compras, Logística, Vendas e Planejamento de Demanda.